Os
processos trazidos pela espetacularização da política têm em seu eixo central
as mudanças ocorridas nos campos da comunicação e da política, e
principalmente na interface que há entre ambos. O fenômeno eleitoral desenha-se
hoje com a inegável hegemonia da mídia.
Um
primeiro fator de clara evidência nesse sentido é a mediação realizada pela
comunicação entre os atores políticos e os cidadãos/eleitores. As
mensagens políticas são emitidas aqui não mais como mero conjunto de
informações, mas como produto planejado, construído em massa e com dados
minuciosamente escolhidos em vista de um público já diagnosticado em suas
características e, principalmente, em seus gostos e desejos. Estas mensagens
surgem agora como mercadoria, especificadamente produzida em vista de um
público consumidor. O fazer político passa a depender então dessa indústria a
fim de atingir seus objetivos.
Planejamento,
produção em massa, projeção de mercado consumidor. Estas e
outras características presentes na comunicação política guardam grande
identidade com um outro conceito muito bem conhecido no campo comunicacional: o
de indústria cultural. A mídia surge aqui, assim como na definição de Theodor
Adorno e Max Horkheimer (1985), como uma verdadeira fábrica de conteúdos
(informações, notícias etc.), tudo isso inserido num mercado maior, com
produtores e consumidores bem definidos.
Afinal,
a participação política hoje pode ser definida como uma mera relação de consumo
de mercadorias simbólicas previamente produzidas? Como, de fato, o público
em questão, o coletivo de cidadãos que compõem a sociedade, se relaciona com as
informações emitidas pelos atores políticos por meio da mídia, num contexto de
produção industrial e consumo de massa da informação política?
A
lógica trazida por essa indústria da comunicação política pode ser
considerada contraditória ao que inicialmente pensou-se ser sua meta. A
comunicação na política surgiu com o objetivo claro de melhor informar os
indivíduos que compõem a sociedade, a fim de que assim elas tivessem condições
de pensar e discutir as posições colocadas e finalmente tomar uma posição.
Teoricamente, através dos meios comunicacionais, abre-se a possibilidade de
existência de contraditório, de debate, de um verdadeiro espaço público, a
partir do qual os cidadãos/eleitores terão sua participação política definida e
baseada numa postura reflexiva.
Mas,
para Adorno e Horkheimer, a hegemonia da racionalidade técnica não
reconhece limites. Está presente em todas as formas de predomínio do homem
sobre o mundo, sobre as coisas e sobre si próprio. Com a ascensão dos meios de
comunicação, ela atingiu definitivamente a cultura, impondo a estas sua
dominação e características.
Sob
"o louvor ao ritmo do aço", imprensa, rádio, cinema e TV se tornam um
sistema da indústria cultural e, sob esta, aceitam-se como mercadoria,
como produto de uma cultura única, que não permite variações. É a padronização
imposta pela racionalidade de quem tem que produzir em massa. Todos os produtos
culturais passam então a trazer dentro de si a marca dessa nova indústria.
Qualquer
que seja a obra, ela acaba por se inserir dentro da lógica de produção
capitalista. Tudo é passível de cópia e reprodução em larga escala:
"[...] apesar de toda a atividade trepidante, o pão com o que a indústria
cultural alimenta os homens continua a ser a pedra da estereotipia"
(ADORNO e HORKHEIMER, 1985, p. 139). Mesmo os objetos de arte não comunicam
hoje outra coisa senão sua transformação em mercadoria.
Inserida
no regime econômico do capitalismo e produzida em larga escala, a cultura
assume definitivamente seu caráter de mercadoria, mediando as relações
entre a indústria cultural e o público, agora consumidor. Para atuar enquanto
mercadoria, a cultura passa a necessitar de publicidade, não a fim de orientar
sobre que produto buscar, mas para reiterar o quão importante é aquele bem para
as pessoas. Da mesma forma intempestiva com que alcançou os bens culturais,
assim também a indústria cultural procedeu com os homens. A estes coube
primeiramente o papel do consumidor, aquele a quem os produtos e as mercadorias
se destinam. "A violência da sociedade industrial instalou-se nos homens
de uma vez por todas. Os produtos da indústria cultural podem ter a certeza de
que até mesmo os distraídos vão consumi-los alertamente." (ADORNO e
HORKHEIMER, 1985, p. 119).
Além
disso, o processo de produção visa fazer com que todos os tipos de gostos e
desejos estejam previamente disponibilizados a todo o público no mercado.
Para o consumidor, não há nada mais a classificar que não tenha sido antecipado
no esquematismo da produção.(ADORNO e HORKHEIMER, 1985, p. 117). Dessa forma,
toda pessoa torna-se um potencial consumidor, reproduzindo mais uma vez a
lógica de dominação da racionalidade: de estar em tudo e em todos.
A
partir de então, a indústria cultural, através principalmente dos meios de
comunicação de massa, passa a ter um papel preponderante na vida cotidiana
das pessoas. A dominação imposta pela racionalidade técnica foi facilmente
assimilada pelas massas, obrigadas a se inserir nas engrenagens do capitalismo
e do esclarecimento: "Quem não se conforma é punido com uma impotência
econômica que se prolonga na impotência espiritual do individualista"
(ADORNO e HORKHEIMER, 1985, p. 125). Os produtos dispostos no mercado
cumprem a função de seduzir os homens, atraídos pela promessa de prazer, mas
impedidos de usufruí-lo.
A
lógica dos produtos oferecidos pela indústria cultural muda completamente a
forma como os homens interagem entre si e com o mundo. Uma vez tornados
meros espectadores, perde-se qualquer possibilidade de reflexão sobre as obras.
A imaginação e a espontaneidade das pessoas se atrofiam pela dominação imposta
sobre a atenção. "Os próprios produtos – e entre eles em primeiro lugar o
mais característico, o filme sonoro – paralisam essas capacidades em virtude de
sua própria constituição objetiva" (ADORNO e HORKHEIMER, 1985, p. 119). Uma
das melhores formas de mediação entre os produtos culturais de massa e o
público é a diversão. Divertir-se significa esquecer-se do mundo e do que
ele tem de pior: as obrigações do trabalho, baixos salários, problemas
pessoais. Mas é também ela quem abre caminho para a dominação exercida. "A
verdade em tudo isso é que o poder da indústria cultural provém de sua
identificação com a necessidade produzida" (ADORNO e HORKHEIMER, 1985, p.
128).
Dessa
forma, conjuga-se o viver e suas dificuldades com a promessa
de futuramente divertir-se, ou melhor, conjuga-se o viver com a busca pela
diversão contida nas mercadorias oferecidas pela indústria cultural.
"Divertir-se significa estar de acordo. [...] É na verdade uma fuga, mas
não, como afirma, uma fuga da realidade ruim, mas da última ideia de
resistência que essa realidade ainda deixa subsistir" (ADORNO e
HORKHEIMER, 1985, p. 135). A diversão torna-se ainda um prolongamento do
trabalho sob o capitalismo tardio. Surge então como uma forma de escape,
procurada por aqueles que desejam distanciar-se, ainda que momentaneamente, do
processo de trabalho mecanizado, a fim de pôr-se novamente em condições de
enfrentá-lo.
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